Entro muma livraria à procura de um livro. Desta vez a horas tardias, o que deixa as livrarias de centro comercial como única opção. Sei o que procuro e por isso dirijo-me à prateleira respectiva: literatura portuguesa, literatura estrangeira, o que for. Procuro com um ar vesgo o autor, que devia estar no lugar que a ordem alfabética lhe confere. Não encontrando, lembro-me que o apelido usado na classificação pode ser o outro, o penúltimo. lá esforço os meus olhinhos, cada vez mais pequenos, através das capas tão fininhas, com letras tão pequeninas e apagadinhas. Não encontro. Pode ser que consiga identificar o livro pelo aspecto, já que aquele autor tem vários livros na mesma colecção. Tento lembrar-me da cor da capa, ou do tamanho. Desta vez os livros já não me param quietos diante dos olhos. Tenho de os percorrer duas ou três vezes. Começo a dúvidar das minhas capacidades. Não é possível que não haja um único livro deste autor.
Os balcões que se espalham pela livraria são o próximo passo. Os livros podem estar em destaque algures, estilo autor do mês ou da semana ou grande promoção, descontos de 20% em todos os livros deste autor, coitado, está a desvalorizar. Mas não. Resigno-me a esperar por um dos inexistentes empregados da cadeia de livrarias. Lá está ele, ali atrás daquela prateleira. Dirijo-me ao rapaz, ou rapariga, que até costumam estar em maioria, falo-lhe no autor e lá vai ela disparada, cheia de confiança, para a prateleira com que eu tinha estado a lutar há minutos atrás, com ar de quem pensa, estes clientes não percebem nada disto. Quando começo a pensar que já devia ter pedido o livro mais cedo, a rapariga começa a perder segurança, a dizer deviam estar aqui, eu vou ver ao computador, hesita, volta à estante, vai ao computador que lhe diz que existem 3 exemplares, volta à prateleira, começa a sentir a pressa do cliente, atrapalha-se, oferece-se para nos dizer se o livro existe noutro sítio, digo que sim mais para a aliviar do que por genuíno interesse, penso nunca mais cá volto, ela diz-me que sim, nas Picoas, quer que telefone para lá, já não é possível porque já é tarde, não se incomode, eu passo por lá, boa noite, boa noite.
Num fim de semana, as livrarias fechadas, lá vou eu às Picoas. Dirijo-me à prateleira respectiva e começo logo a ficar com os olhos pequeninos. Mais um empregado, mais uma confusão, o computador, quer que veja se há noutra livraria, não, deixe estar, nunca mais cá volto, nunca mais volto a uma livraria com computadores, até à próxima noite em que me faça falta um livro daquele autor, aquele que tem tantos livros na mesma colecção que pode ser que eu os reconheça pelo aspecto.
Crónica bem inspirada, será pelo autor dos livros que procuravas?...
ResponderEliminarParece-me que sim. É impressionante este poder de contágio.
ResponderEliminaramazon.co.uk
ResponderEliminarQue desmancha prazeres! Se não fosse isto não tinha nada para escrever.
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