quarta-feira, junho 06, 2007

The Road to Reality

O "Metro" do Porto tem um espaço de que gosto muito. Trata-se de três assentos separados de outros tantos lugares por um estreito corredor, e é o sítio ideal para uma observação atenta dos nossos vizinhos. Tenho de confessar que há muito que a minha alma de voyeur me impede de me
sentar noutro lugar. Juro que vale a pena.

A (primeira) rapariga a que hoje dediquei a minha atenção cruzou a perna demasiado decidida. Não pude deixar de achar piada. Depois, com outro gesto dramático sacou do livro Como Ficar Rico. Nessa altura lembrei-me de que o dinheiro não traz a felicidade, para a qual de qualquer maneira não há receita, mas não duvidei de que a minha companheira de viagem tinha a certeza de que nasceu para ser rica. O livro rimava com os seus gestos e o título estava-lhe escrito na cara. Por momentos acreditei naquele ditado popular Diz-me o que lês, digo-te quem és - como se fosse possível a tal ditado ser "popular" num pais de analfabetos.

Isto tudo para chegar à minha mesa de cabeceira e aos livros que por lá andam. O que será que dizem sobre mim? Daqui entrevejo The complete Tutankhamum: The King.The Tomb.The Royal Treasure. É reconfortante saber que alguém que, para além de morrer, não fez nada digno de nota, continua a ser recordado passados 3500 anos. Por baixo deste tenho Einstein: a life. Mais outro tipo que nada fez de muito relevante... Passando pel'A queda de Roma e o fim da civilização e um policial de Donna Leon, chego a

The Road to Reality
A Complete Guide to the Laws of the Universe


O autor deste volumoso volume de 1099 páginas é o famoso matemático inglês Roger Penrose. Até os desenhinhos são dele.

Nesta altura o leitor atento estará inquieto: o que pode um matemático (!) saber sobre a Realidade e as Leis do Universo? De facto, é inegável que - excluindo talvez Deus - em regra só os físicos é que possuem as ferramentas necessárias para perceber a Realidade e as Leis do Universo. Mas, na minha opinião, este livro prova que Penrose é uma excepçao à regra.

Para mim "O Caminho..." é um opus delicioso. Em nenhum outro lado se encontra num livro de divulgação secções tais como

4.5 How to construct the Mandelbrot set
15.7 Non-triviality in a bundle connection

ou mesmo

31.14 The magical Calabi-Yau spaces; M-theory

ao lado de

34.3 The role of fashion in physical theory

Penrose avisa no prefácio que não hesitou em apresentar fórmulas apesar de admoestações sérias de que veria o número de leitores a cair. A ideia dele era ir apresentando a matemática necessária para entender a física à medida que se vai avançando no livro. E na verdade devo dizer que no meu caso foi bem sucedido. Mas como sou físico teórico e já tinha algumas noçõezinhas de matemática não me considero muito representativo.

Por isso lhe peço um favor, caro leitor! Vá à Amazon e desembolse 40 libras ou compre a versão portuguesa, se houver. E depois conte-me se conseguiu perceber a Realidade e aprender as Leis do Universo. Na versão de Roger Penrose, claro está. Eu cá acho que vale a pena.

2 comentários:

  1. Que tipo de noçõezinhas de matemática é que são necessárias? Isto de se ser físico teórico não é brincadeira! É acessível ao resto dos físicos do blog? (Claro que a pergunta inclui o Pedro, por muito que lhe custe, e a "Criatura do ...", que tu conheces!)

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  2. A questão é mesmo essa: será que as várias ideias descritas neste livro (supostamente de divulgação) serão apenas acessíveis aqueles que já têm alguma noção da matemática que é necessária para as compreender? Eu tive imenso prazer em ler parte do livro, mas já tinha as tais "noçõezinhas" de geometria e topologia que são importantes para o entender.

    Outras partes do livro descrevem a teoria da relatividade restrita ou a mecânica quântica, que são acessíveis a quem conhece algebra linear e teoria de grupos.

    Porque é que gostava de saber se leitores com outro background matemático conseguem ler o livro de Penrose? Porque se assim fosse, isso invalidaria a ideia habitual de que para se poder explicar física a um leigo é necessário despí-la da sua estructura matemática e reduzi-la a analogias engraçadas mas redutoras... É preciso ver que a física teórica não é brincadeira :-)

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